ASPECTOS INTERNACIONAIS DA ARBITRAGEM MARÍTIMA NO BRASIL (segunda parte)

Leia a continuação artigo impresso na Edição Especial Guia Marítimo Intermodal, os advogados Dr. José Gabriel Assis de Almeida e Dr. João Marcelo Sant´Anna explicam o funcionamento das câmaras de arbitragem no Brasil.


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B. Reconhecimento e execução, no Brasil, de sentença ou decisão arbitral estrangeira.

Em 1958, foi celebrada, na cidade de Nova York, a Convenção Internacional sobre o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras. Quase seis anos após a promulgação da Lei de Arbitragem brasileira, que já dispunha, em 1996, de sete artigos e um capítulo inteiro para tratar do tema, o Brasil veio a ratificar a referida Convenção de Nova York através do Decreto Federal nº 4.311. de 2002.

Nesse sentido, em um primeiro momento, coube ao Supremo tribunal Federal, por força do disposto no artigo 102, inciso I, alínea ‘h’, da Constituição da República Federativa do Brasil, homologar (ou reconhecer) as sentenças arbitrais estrangeiras. No entanto, com o advento da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, essa competência passou, e permanece até os dias atuais, para o Superior Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 105, inciso I, alínea “i”, da CRFB/88.

Dessa forma, para que possa vir a ser executada no Brasil, uma sentença arbitral estrangeira deve, antes, ser homologada pelo STJ. Para tanto, a parte interessada deve instaurar processo de homologação de sentença estrangeira perante o STJ. Por conseguinte, o STJ determinará a citação da outra parte, que poderá se opor ao pedido de homologação.

Ao final do processo, após verificar se a sentença arbitral estrangeira atende aos requisitos estabelecidos no Regimento Interno do próprio STJ, na Lei de Arbitragem brasileira, no Código de Processo Civil e na Convenção de Nova York (que são praticamente os mesmos), o STJ homologará ou não a sentença arbitral estrangeira.

Em resumo, para ser homologada, a sentença arbitral estrangeira (i) deve ter sido proferida em arbitragem na qual as partes tenham sido regularmente citadas, (ii) deve ser válida segundo as leis do país em que foi proferida, (iii) não pode ter sido anulada previamente por autoridade judiciária brasileira ou estrangeira, (iv) deve ter feito coisa julgada e (v) não pode ofender a ordem pública brasileira.

O STJ não analisa o mérito da sentença arbitral estrangeira, pode homologá-la apenas parcialmente e pode deferir medidas de urgência ou a sua execução provisória. Uma vez homologada pelo STJ, a sentença arbitral estrangeira torna-se título executivo judicial e pode ser executada, no Brasil, perante o Juiz Federal competente para o cumprimento de sentenças judiciais brasileiras.

Outra questão importante diz respeito à execução, no Brasil, de decisões interlocutórias proferidas por tribunais arbitrais estrangeiros. Decisões interlocutórias são todo pronunciamento de natureza decisória que não põe fim ao processo (diferente de uma sentença). Portanto, decisões concessivas de medidas de urgência, como medidas cautelares proferidas em arbitragens marítimas, são consideradas decisões interlocutórias.

Para que uma decisão interlocutória proferida por um tribunal arbitral estrangeiro possa ser executada no Brasil, é necessário que o referido tribunal arbitral (ou a autoridade judicial local, se for o caso) expeça uma carta rogatória ao Brasil e que o STJ conceda exequatur à referida carta rogatória.

Antes da concessão do exequatur, a carta rogatória passará por processo similar ao de homologação de sentença arbitral estrangeira. Uma importante diferença, contudo, está no fato de que o exequatur poderá ser concedido à carta rogatória e a medida nela solicitada poderá ser cumprida sem que seja realizada previamente a oitiva da parte requerida. Isso por ocorrer, por exemplo, quando a intimação prévia da parte requerida puder resultar na ineficiência da medida ou da cooperação internacional. O STJ não fará juízo de valor sobre a urgência ou não da medida.

Após a concessão do exequatur, a carta rogatória será remetida ao Juízo Federal competente para cumprimento da medida nela contida, passando a ser considerada título executivo judicial. Cumprida a medida ou verificada a impossibilidade de seu cumprimento, a carta rogatória será devolvida ao STJ para encaminhamento de volta ao país de origem.

Do exposto, conclui-se que medidas cautelares ou de urgência proferidas por tribunais arbitrais estrangeiros, como por exemplo medidas cautelares marítimas, podem ser cumpridas no Brasil.

O interesse de se homologar, no Brasil, uma sentença arbitral estrangeira ou de se obter exequatur à carta rogatória para execução, no Brasil, de medida cautelar marítima pode decorrer de vários fatores. A título de exemplo, podem existir bens da parte requerida no Brasil ou uma obrigação pactuada pode ter que ser cumprida no país.

Conclusão.

Conforme demonstrado acima, o Brasil é um País amigável à arbitragem, sendo uma via de duas mãos, pois o direito brasileiro reconhece a arbitrabilidade no Brasil de litígios marítimos internacionais ou estrangeiros, como aceita o reconhecimento e execução, no Brasil, de sentenças arbitrais estrangeiras.

José Gabriel Assis de Almeida é Doutor em direito pela Université Panthéon Assas – Paris II, Professor Adjunto da UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Advogado.

Dr. João Marcelo Sant´Anna é Mestrando em direito pela UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Advogado


Escrito por:

Falando Direito

Sessão dedicada aos profissionais de Direito que mantêm parceria com o Guia Marítimo.



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