Canal do Panamá: expansão e perspectivas

Em continuidade ao tema da semana passada, Leandro Barreto levanta as possibilidades das novas travessias do canal, comparando tarifas e oportunidades.

LeandroBarreto2A expansão do Canal do Panamá envolve um investimento estimado em US$ 5 bilhões, que inclui a construção de duas novas eclusas com 55m de largura, 427 m de comprimento e 18,3 m de altura cada, que funcionarão paralelamente às atuais eclusas. A obra foi iniciada em 2007, e tinha previsão inicial de estar concluída até 2014. Seu objetivo principal seria expandir a capacidade do canal, tanto em termos de quantidade diária de passagens quanto em suas dimensões, de maneira que possa atender à evolução do tamanho dos dois tipos de navios que mais frequentam o Canal do Panamá atualmente: porta-contêineres e graneleiros, conforme demonstrado no artigo da última semana.


Após seguidos atrasos, especialmente em decorrência de desentendimentos entre o governo do Panamá e o consórcio construtor, hoje a obra está 96% concluída e deve iniciar já em abril de 2016 um período de testes previsto para durar dois meses, ou seja: oficialmente, a inauguração está marcada para junho de 2016, mas há quem diga que, antes da realização dos primeiros testes, seja difícil informar com precisão a data da inauguração.

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Em relação aos efeitos da inauguração do novo Canal do Panamá para o Transporte Marítimo Internacional, de imediato a expectativa é de que sejam retomados de 3 a 5 serviços de navios porta-contêiner entre a Ásia e a Costa Leste dos EUA "perdidos" para o Canal de Suez nos últimos anos. Porém, de forma geral, as percepções e expectativas em relação aos potenciais efeitos da inauguração estão longe de ser unânimes. Entre os argumentos favoráveis ao canal estão os que acreditam que os navios porta-contêiner que saem da Ásia com destino aos EUA não mais escalarão os portos da Costa Oeste Americana (Ex.: Long Beach e Los Angeles), já que poderão seguir diretamente para os portos da Costa Leste Americana - maior mercado consumidor daquele país (Ex.: Houston, Miami, Charleston, New York, Jacksonville, Baltimore). Com isso, tanto os portos da Costa Oeste Americana quanto as Ferrovias transoceânicas americanas ficariam subutilizadas.


Outros, como o Prof. Dr. Asaf Ashar da University of New Orleans (um dos responsáveis pela concepção e design do Terminal Embraport/Santos) sugerem, porém, que a expansão do Canal "nascerá" defasada - os maiores navios em operação atualmente com 18.000/20.000TEU não poderão frequentar o canal - e que está pelo menos uma década atrasada. Durante o período de readequação do canal, tanto os portos da Costa Oeste Americana quanto o transporte ferroviário naquele país se desenvolveram muito e, atualmente, já são capazes de receber e operar de maneira competitiva os mega navios (recentemente, a CMA CGM operou em Los Angeles e Long Beach o navio Benjamin Franklin de 18.000 Teus e anunciou que fará o upgrade do serviço Pearl River Express para navios desse porte a partir de maio de 2016).


Falando mais especificamente sobre os efeitos da expansão do Canal do Panamá sobre o transporte marítimo no Brasil, em termos de impactos diretos, ele encurtará a distância e o tempo de viagem para os grãos embarcados em navios Post-Panamax e Capesize no trajeto entre os portos do Norte do Brasil (Vila do Conde-PA e Itaqui-MA) até a China (principal comprador), no caso do famoso "Arco Norte" de fato se consolidar como um importante corredor brasileiro de exportações de grãos (no próximo dia 31 de março a Antaq licitará seis áreas no Pará e o resultado desse leilão poderá dizer muito a respeito do futuro do "Arco Norte").


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Elaborado por Leandro Barreto | Fonte: MarineCircle


As grandes tradings do setor de grãos estão apostando que o ganho de escala proporcionado pela utilização dos navios maiores e a redução de cerca de 3 dias do tempo de viagem – e, consequentemente, os custos diários com afretamento e combustível – sejam suficientes para cobrir as taxas cobradas para utilização do canal. Além disso, justificaria o investimento bilionário que está sendo realizado atualmente em ETCs (Estações de Transbordo de Carga) na região de Miritituba/Santarezinho, bem como na expansão da estrutura portuária de Vila do Conde e Itaqui.


Geograficamente falando, outro setor nacional que poderia ser diretamente beneficiado pela expansão do canal seria o minério exportado à China através do porto de Itaqui/Maranhão, todavia, tendo em vista que os navios Valemax (maior navio do mundo em tonelada de carga transportada) utilizados para esse transporte excedem em muito as dimensões do novo canal, seja em largura, seja em profundidade.


No que se refere ao segmento de contêiner, tendo em vista que alguns dos principais parceiros comerciais do Brasil (ex.: Europa, Costa Leste dos EUA e Oriente Médio) não demandam a passagem pelo Canal e que a imensa maioria do volume comercializado com a Ásia tem com origem/destino os portos do sudeste/sul do Brasil - além do fato de se tratarem de volumes expressivos e que justificam a escala direta de um navio - a rota pelo sul da África é mais curta/barata do que utilizar o Canal do Panamá. A única exceção seriam as cargas com destino à Zona Franca de Manaus, que poderiam ser atendidas via um Hub no Caribe ou nordeste do Brasil.


Já entre os principais impactos indiretos da expansão do Canal do Panamá para o Brasil está a aceleração do processo de conteinerização de banana do Peru, Equador e América Central exportada para Europa, Rússia e Costa Leste dos EUA (principalmente quando o preço do petróleo voltar a subir e inviabilizar os navios fullreefer). Tendo em vista que grandes volumes de banana são transportados hoje em navios fullreefer através do canal do Panamá (ver artigo da semana passada), a conteinerização da banana pressionará ainda mais o já limitado estoque de contêiner reefer dos armadores e afetará diretamente os exportadores brasileiros de carnes e frutas.


Ou seja: do ponto de vista geográfico, a expansão do Canal do Panamá até pode se mostrar bastante óbvia para algumas rotas, entretanto, com a drástica queda dos custos do combustível e de afretamentos dos navios, as tarifas para travessia do novo Canal terão de ser bastante atrativas, caso contrário receio que num momento de não menos drásticas quedas dos fretes marítimos as simulações que estão sendo realizadas pelos armadores poderão demonstrar que não basta ser mais próximo, também precisa ser mais barato.


Leandro Barreto é administrador de empresas, especializado em economia internacional pela Universidade de Grenoble e em Inteligência Competitiva pela FEA/USP. Há mais de dez anos atuando no segmento, foi gerente de Inteligência de Mercado na Hamburg-Süd, professor pelo IBRAMERC e Diretor de Análises da Datamar Consulting. Atualmente, coordena projetos independentes de consultoria com forte atuação junto a armadores, autoridades portuárias, embarcadores e entidades públicas voltadas para o desenvolvimento do setor portuário.

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