Brasil pode perder competitividade nos portos

Burocracia, logística ineficiente e tantos outros fatores negativos impactam o setor, aumentando o chamado Custo Brasil

Lançamento de navios cada vez maiores com tanta rapidez traz para a logística brasileira a necessidade de mudanças na mesma velocidade. Maiores calados, terminais cada vez maiores e mais preparados para receber essas embarcações. Junto a isso, a infraestrutura brasileira precisa melhorar e dar lugar aos modais que parecem cada vez mais esquecidos, a exemplo, a malha ferroviária brasileira, que além de sucateada e pequena, é diferente de uma região para outra. Além disso, a burocracia, as altas tarifas, os muitos anúncios de investimentos e poucas ações propriamente ditas, causam pânico e desânimo para um setor que carece cada vez mais de atitude.

Traçando um panorama do cenário do setor portuário, o Diretor Presidente da ABTP (Associação Brasileira de Terminais Portuários), Wilen Manteli, conversou com exclusividade com o Guia Marítimo e apontou que tantos fatores negativos impactam de forma importante o setor, “justamente aumentando o chamado Custo Brasil”.

Manteli comenta ainda sobre a importância do modal ferroviário quanto do modal hidroviário, “essenciais para o desenvolvimento econômico e social de qualquer país”. E que, segundo ele, é possível ver apenas olhando a experiência dos países desenvolvidos.

Sobre melhorias, trabalhos realizados ou que ainda precisam ser colocados como prioridade, altos custos, necessidades de mudanças e as expectativas para 2016, Manteli destacou a necessidade de mais e melhores investimentos na ampliação e modernização dos terminais portuários e foi enfático: “O excesso de intervenção do Estado nas atividades portuárias, o excesso de burocracia, o processo errático de regulação, a não modernização da relação do capital e trabalho. Tudo isso fere a livre iniciativa e ora inibe, ora encarece os investimentos”.

GM - Qual a situação da infraestrutura portuária brasileira hoje?

Manteli –Destaco os importantes investimentos privados na infra e superestrutura em terminais privados e arrendados - tanto em instalações de terra, equipamentos, cais e até acessos terrestres e aquaviários. O problema centra-se nos investimentos que dependem do governo, notadamente nos acessos aos portos em terra e na água, especialmente no aprofundamento dos canais para permitir a entrada e saída de grandes navios e na manutenção dos aprofundamentos. Portos competitivos dependem de águas profundas. Neste último caso, o governo está andando de lado.

GM - Quais as maiores dificuldades enfrentadas no transporte de cargas no País?

Manteli – Historicamente, o maior entrave dos nossos portos são a governança da atividade portuária e a estrutura burocrática. São tantos os órgãos públicos que interferem na atividade portuária que isso gera insegurança jurídica para aqueles que investem no setor. Somado a isso, a excessiva burocracia nas operações de importação e exportação resulta num tempo improdutivo nos terminais. Esse tempo improdutivo é caríssimo.

GM – Por que os custos de transporte são tão altos?

Manteli – O excesso de intervenção do Estado nas atividades portuárias, o excesso de burocracia, o processo errático de regulação, a não modernização da relação do capital e trabalho. Tudo isso fere a livre iniciativa e ora inibe, ora encarece os investimentos. Por essa governança confusa e pouco contemporânea, pagamos todos um preço. Esse é o chamado Custo Brasil.

Por isso insistimos: apenas com mais e melhores investimentos na ampliação e modernização dos terminais portuários, seremos capazes de praticar preços mais competitivos e atender as permanentes e crescentes exigências do comércio internacional. Sem esses investimentos, inibidos pelas amarras que temos hoje, nossos preços vão se manter altos e o país, pouco eficiente."No setor portuário, para mudar esse quadro de burocracia e de excesso de intervenções regulatórias e de insegurança jurídica, não precisamos de investimentos públicos, mas de vontade política: seriedade, espírito público e uma forte e inarredável atenção voltada para as verdadeiras necessidades brasileiras – geração de riqueza e de empregos".

GM - As rodovias têm um papel de destaque no transporte de mercadorias, mas ainda não possuem infraestrutura adequada. Como esses novos investimentos do governo podem ajudar? Qual a importância de uma parceria público-privada?

Manteli – As rodovias são estratégicas para o escoamento da produção e para o transporte de pessoas. O que está faltando é uma verdadeira integração dos modais de transporte. As PPPs se constituem no desfazimento desse nó que impede o País de se desenvolver. Elas são a solução.

GM - A malha ferroviária brasileira, além de sucateada e pequena, é diferente de uma região para outra. Como isso impacta no escoamento das mercadorias e como podemos mudar esse cenário?

Manteli – Impacta de forma importante, justamente aumentando o chamado Custo Brasil. Tanto o modal ferroviário quanto o modal hidroviário são essenciais para o desenvolvimento econômico e social de qualquer país. Isso não se discute, basta olhar a experiência dos países desenvolvidos.

No que depende do setor portuário, temos visto melhorias na integração rumo a um transporte intermodal no país. Porque é preciso entender que quando falta integração, todos perdemos – e a malha ferroviária brasileira é um exemplo disso. Em muitos portos já há planejamento entre produtores, transportadores, porto e armadores.

GM - Como a cabotagem pode ajudar?

Manteli – A cabotagem ajuda e muito. Os armadores estão se associando e pensando em ganhos de escala. Estão construindo navios com grande capacidade de carga, tanto de contêineres como de granéis. Teremos na costa brasileira, em futuro breve, três ou dois portos concentradores (hub port), enquanto os demais se transformarão em portos auxiliares (feeders). Isso exigirá o crescimento de nossa cabotagem. Agora cabe adotar as medidas necessárias (fiscais, financeiras, adaptação de cais, entre outras) para viabilizar as empresas que operam nesse segmento.

GM - Quais as expectativas com os novos investimentos anunciados?

Manteli – São boas. Teremos agora no final do mês os leilões de quatro áreas nos portos do Pará. O ministro dos portos, Helder Barbalho, já disse que vai lançar mais 20 editais para licitar cerca de 93 áreas portuárias. A despeito da crise, o setor portuário tem grande potencial e está atraindo investidores. Há uma forte demanda dos setores produtivos, voltados para o comércio internacional.

GM - Quais as perspectivas para 2016?

Manteli – Quero olhar do ponto de vista positivo. Temos oportunidades para avançar em 2016. Mas o Brasil precisa romper com a excessiva intervenção estatal no setor portuário, com legislação e normas infralegais que afetam negativamente as empresas uma vez que tornam precárias as condições contratuais e geram insegurança jurídica para os agentes econômicos. Temos hoje uma verdadeira inflação de atos normativos, sem base legal. Ora, democracia econômica significa democracia de mercado. Precisamos fazer valer, no dia a dia do setor, fazer valer o primado da livre iniciativa e da livre concorrência, estabelecido na Constituição Brasileira. Isso é realmente urgente.

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