SOJA, PESTE AFRICANA E FRETE REEFER

Embora o título do artigo possa parecer um tanto quanto desconexo, veremos como os tópicos podem ter relação uns com outros.

Solve Shipping e o Destaque do mês.


 


Em outubro do ano passado foi observado o primeiro foco da Peste Suína Africana em território chinês. A partir dai a doença vem se espalhando pelo país em proporção alarmante. As autoridades vêm tomando medidas sanitárias para tentar circunscrever a doença pelo estabelecimento de cordões sanitários e o abate de todos os porcos presentes nas granjas em que são identificados qualquer caso. Esse controle sanitário, porém, tem sido bastante difícil devido à estrutura produtiva da China, já que imensa maioria da produção de suínos está nas mãos de pequenos granjeiros individuais.

Como maior produtor e consumidor mundial de suínos, uma situação dessas traz consequências para o mundo todo. Até o surgimento da peste o rebanho chinês era de 440 milhões de cabeças, contra 150 milhões de cabeças na União Europeia, 73 milhões nos EUA e 39 milhões no Brasil. Os chineses, portanto, detém metade do rebanho mundial, mas de acordo com o Escritório Nacional de Estatística da China, a produção de carne suína nos primeiros três meses desse ano já apresenta uma redução de 5,2% com relação ao mesmo período de 2018 (estima-se que o rebanho já tenha sido reduzido em 10 milhões de cabeças).

Especialistas estimam que com a eliminação sistemática do rebanho chinês, poderá se chegar a um déficit anual de 16,2 milhões de toneladas de carne suína naquele mercado, o que isso significa um volume equivalente a 1,3 vezes a produção dos EUA em 2018. Ou ainda o equivalente a 810 mil contêineres de 40’ hc.

Como os chineses não são autossuficientes na produção de soja para ração animal, tornaram-se os maiores compradores mundiais da oleaginosa, cujos principais fornecedores são o Brasil e os EUA, mas, em virtude da guerra comercial entre americanos e chineses, no ano passado o Brasil aumentou consideravelmente suas vendas de soja para a China. A partir do surgimento da peste, porém, a tendência é de queda na demanda chinesa de soja, face à diminuição do rebanho.

Segundo analistas a recomposição do rebanho, após controlada a peste poderá levar de três a cinco anos. Isso fará com que a China tenha de recorrer a outros produtores para suprir sua demanda por proteína animal e os candidatos a verem suas vendas aumentarem serão: Brasil, Canadá, União Europeia e até mesmo EUA, a despeito das tarifas hoje em vigor.

Quais as consequências para o Brasil?

Se por um lado, com o rebanho chinês menor, haverá menos demanda para as exportações de soja brasileira, por outro lado isso poderá beneficiar o mercado interno, liberando volumes para um provável aumento da demanda de ração para atender esse aumento da demanda chinesa por proteína animal.

Os produtores de suínos já estão experimentando um importante aumento na produção e exportação dessa proteína para a China. Analistas estimam que o Brasil deverá ser o principal fornecedor de carne suína à China. O Presidente da ACSURS (Associação dos Criadores de Suínos do RGS), Valdecir Folador espera com isso ver a produção gaúcha crescer de forma considerável para atender a esse consumo maior.

Outro efeito colateral será um aumento na demanda de carne de frango pela China já que, com a escassez de carne suína, os preços subirão e poderá levar as pessoas a buscarem proteínas mais baratas, no caso o frango. Segundo o Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China os preços da carne suína já subiram no mês passado entre 6,3% e 7,6% com relação há um ano atrás, sendo que as autoridades estimam esses preços podem subir até 70% no segundo semestre, se tornando o vilão da inflação chinesa.

Diante desse cenário é esperado um importante aumento na demanda por capacidade frigorifica na rota Brasil >> Ásia para atender esse aumento nas exportações de carnes, o que associado ao sucateamento de navios full reefer (conteinerização de frutas) e a desaceleração no ritmo de construção de novos contêineres reefer, tendem puxar os fretes para cima.


Escrito por:

Robert Grantham

Formado pela PUC/RS com licenciatura em ensino da língua inglesa, Robert Grantham desenvolveu sua carreira na área da navegação, atuando como executivo em agencias marítimas, como Wilson Sons, Orion e Lachmann, com passagem pelo Banco de Desenvolvimento do Estado do Rio Grande do Sul (Badesul), atuando na área internacional. Posteriormente foi o responsável pelo start-up das operações da China Shipping no Brasil e Diretor Comercial e Executivo do Porto de Itajaí. Atualmente dedica-se a consultoria, como sócio da empresa Solve Shipping Specialists, tendo realizado trabalhos para Drewry, TESC, LogZ, Porto de Itajaí, Steamship Mutual - P&I, Norsul entre outros. Como palestrante e moderador participou de eventos como Mare Forum, Port Finance International Brazil, Container Handling Technology Brazil, Itajaí Trade Summit. É colaborador da revista Container Management e Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem do Brasil (CAMEDIARB) e da Câmara de Arbitragem e Mediação de Santa Catarina (CAMESC).



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