Reforma cambial promete maior facilidade para negócios

A reforma cambial brasileira entra em vigor só no final de dezembro, mas já movimenta o mundo empresarial e financeiro de olho nas novas oportunidades de modelos de negócios, tecnologia e atração de investimento estrangeiro diante da maior liberdade para as operações com moeda estrangeira. Os setores de infraestrutura, fintechs, mineração, exportadores, empresas de tecnologia e bancos em geral estão entre os que mais têm apresentado interesse na nova legislação. Depois do Pix nacional, a regulamentação da lei cambial abrirá as portas para o pagamento instantâneo internacional – realidade cada vez mais próxima.

A nova lei também permite a compra e a venda de moeda estrangeira entre pessoas físicas (prática atualmente vedada), com limite de até US$ 500. O objetivo é possibilitar a venda de sobras de moedas estrangeiras após o fim de uma viagem internacional, por exemplo. Transações realizadas por profissionais de forma recorrente, ou seja, pelos chamados “doleiros”, continuam proibidas.

A declaração de moeda em espécie para viagens internacionais, na entrada e na saída do Brasil, passará a ser obrigatória a partir de US$ 10 mil. O argumento é que o limite anterior de R$ 10 mil, instituído em 1995, está defasado. O novo limite, referenciado em dólares, está em linha com o que acontece no resto do mundo.

Nada disso seria possível sem a modernização da arcaica e complexa legislação cambial (o Brasil tem uma lei de 1920 em vigor), comparada às grandes reformas estruturantes da economia, com o maior uso internacional da moeda brasileira, o real. O que se espera é um comércio exterior com menos amarras e maior financiamento para a compra de produtos brasileiros pelos importadores.

Os detalhes da implementação da lei serão conhecidos neste mês, quando o Banco Central colocará em audiência pública a proposta. A implantação da lei será também a ponta de lança da segunda fase da Agenda BC#, a ser lançada pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para os próximos anos no rastro das medidas que já deram frutos, como o open banking (compartilhamento dos clientes entre os bancos) e o Pix. Com a autonomia do BC, Campos Neto tem mandato garantido até 2024.

Para o BC, a lei cambial estimula a maior inserção das empresas brasileiras – inclusive pequenas e médias – nas cadeias globais de valor, eliminando restrições para que exportadores possam utilizar livremente seus recursos, além de contar com mais mecanismos de financiamento aos compradores de seus produtos.

Do lado das compras externas, permite que, no caso de importação financiada, o produto não precise entrar fisicamente no País antes do início dos pagamentos. A oportunidade de uma inserção maior do Brasil nas cadeias globais de produção e bens ganhou com a guerra da Rússia com a Ucrânia, como vem sendo enfatizado pelo BC.

A expectativa no mercado é grande com a regulamentação, diz Pedro Eroles, sócio do escritório Mattos Filho. Segundo ele, a lei abre o mercado de câmbio e torna o comércio internacional mais simples e menos oneroso. Um dos pontos centrais da regulamentação a que está todo mundo de olho é quais as hipóteses em que serão permitidas a chamada compensação privada no exterior.

Eroles destaca, por exemplo, a expectativa em torno da possibilidade de celebrar contratos em moeda estrangeira. Já há na nova lei indicação de que exportadores que celebrem contratos com prestadores de serviços, como concessionários, possam fazê-lo em contratos em moeda estrangeira. Outra permissão é que bancos no Brasil possam captar no Brasil em reais e fazer empréstimos fora do País.

“Qualquer empresa que tenha pagamento internacional envolvido (na sua atividade) vai ser impactada pela nova lei”, diz o advogado. Ele aposta que o Pix internacional, quando implementado no futuro, vai     baratear as remessas internacionais, com uma diminuição do chamado custo Brasil.

Pela legislação ainda vigente, as instituições financeiras são obrigadas a classificar as remessas em moeda estrangeira sob pena de multas e sanções. Essa responsabilidade passa a ser do cliente, e a instituição financeira vai apresentar o suporte para essa classificação. Hoje, existem cerca de 200 códigos de classificação e a intenção do BC é reduzir para apenas seis.

As mudanças estão casadas com a redução em etapas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de câmbio até ser zerado em 2028 – uma das exigências para o País integrar a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Para Rubens Sardenberg, porta-voz da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), a avaliação tem sido muito positiva porque a legislação é muito antiga, com custos altos. Segundo ele, permite que o banco passe a fazer avaliação de risco com maior foco em seus clientes e menos em cada operação, além da livre utilização das receitas de exportação no exterior (pelo exportador) e o financiamento a estrangeiros que compram do Brasil, sem que estes estejam ligados a alguma empresa brasileira.

Analista da Unidade de Capitalização e Serviços Financeiro do Sebrae, Giovanni Beviláqua destaca a importância para as micro e pequenas empresas. A operação comercial com o exterior é hoje muito complicada para os pequenos negócios, pois envolve a troca de moedas submetidas a uma taxa de conversão, a taxa de câmbio, que sofre altos e baixos tornando o planejamento financeiro das empresas mais difícil. Agora, poderão ter contas bancárias em dólar; assim, uma empresa que vende para o exterior algo por US$ 1.000 irá receber esse valor em sua conta, sem ter de convertê-lo em reais.

FONTE: Valor

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