What's cooking: 3 temas que merecem atenção
Panamá, VGM e Bunker têm definido o cenário da navegação comercial no mundo
Muitos dos assuntos tratados recentemente nesta coluna tiveram importantes desdobramentos nos últimos dias e, com isso, em vez de tratarmos exclusivamente de um tema, nesta semana faremos uma breve atualização desses assuntos já abordados.
1. INAUGURAÇÃO DO NOVO CANAL DO PANAMÁ:
No último domingo de junho (26), o porta-containers CoscoShipping Panamá, com seus 9.400 Teus, 300 m de comprimento e 48,25 m de largura, foi o primeiro navio a cruzar as novas eclusas do Canal do Panamá. Com a sua capacidade expandida tanto em relação ao tamanho máximo do navio (que passou de cerca de 5.000 Teus para 14.000 Teus) quanto em quantidade diária de passagens, o canal agora atualmente só não vai comportar cerca de apenas 3% da frota mundial de porta-containers, ou seja: 178 navios não conseguirão utilizar essa rota devido à limitação de tamanho. Antes da expansão, o canal impedia a passagem de 35% da frota mundial, ou 1.870 navios. O novo cenário, no entanto, já tem provocado“contra-ataques” de seus principais concorrentes:
• O Canal de Suez anunciou redução de tarifas de até 65% para serviços entre a Ásia e a Costa Leste dos EUA);
• Os portos da Costa Oeste dos EUA andam dizendo ao mercado que os portos da costa leste americana não possuem knowhow e infraestrutura, como Gates, ferrovias e conexões multimodal, para operar navios grandes, além de que o tempo de viagem pelo canal do Panamá será maior e, portanto, inviável para alguns tipos de carga;
• As Ferrovias transoceânicas norte americanas vêm avaliando reduções de preço.
No limite, a expansão do canal cumpre seu papel de aumentar a concorrência e contribuir para a redução do custo unitário de transporte.
E para o Brasil
Dada a grandiosidade da obra, sua relevância histórica e seus números impressionantes, a mídia local até que repercutiu bastante a inauguração das novas eclusas, demonstrando, porém, que os impactos para o Brasil serão nesse momento bastante restritos, por diferentes motivos:
• Container: mais de 85% do volume de containers comercializados entre Brasil e China tem como origem/destino os portos do Sul/Sudeste do Brasil, sendo a rota mais curta, portanto, feita pelo Cabo da Boa Esperança/África do Sul;
• Minérios: ao contrário dos portos do Sul/Sudeste, faria geograficamente mais sentido escoar pelo Canal do Panamá o minério produzido pela Vale em Carajás/PA e embarcado no Porto de Itaqui/MA. Todavia, as dimensões do navios Valemax coloca-os no seleto grupo de embarcações que excedem em largura e profundidade as novas dimensões do Canal;
• Grãos: apesar dos vultosos investimentos que estão sendo realizados pela iniciativa privada, notadamente as tradings, no famoso Arco Norte, dadas as atuais cotações do petróleo e do custo de afretamento dos navios, seria economicamente mais viável ir de Vila do Conde a Xangai pelo Cabo da Boa Esperança (mesmo com 4,5 dias a mais de viagem) do que pagar as taxas cobradas para cruzar o Canal do Panamá.
Em termos práticos para o Brasil, o Canal do Panamá beneficiará as cargas escoadas pelos portos das regiões Norte e Nordeste do país, sendo as importações em Container da Zona Franca de Manaus e os grãos escoados pelo “Arco Norte” os maiores interessados. Contudo, para que isso se torne realidade ainda será necessário:
• Container: viabilizar um Hub Port no nordeste;
• Grãos - Conjuntura Internacional: re-equilíbrio entre oferta e demanda de navios Dry Bulk e retomada da cotação do petróleo;
• Grãos - Gargalos logísticos Brasil: extensão da Ferrovia Norte-Sul de Açailândia a Vila do Conde e a Concessão do segundo lote da BR 163 (Sinop / Miritituba) ou Construção da Ferrogrão (Lucas do Rio Verde / Miritituba).
Quer saber mais? Leia no Valor Econômico e em Container Mag.
2. INÍCIO DO VGM:
Desde o último dia 1 de julho, por determinação da IMO (International Maritime Organization), a agência da ONU que regula o transporte marítimo internacional, estão em vigor as novas normas de Verificação da Massa Bruta do container visando aumentar a segurança das embarcações através da declaração, por parte dos embarcadores, do peso bruto dos containers.
Pelo que temos acompanhado pela mídia nacional/internacional e em conversa com alguns armadores, terminais, embarcadores e agentes de carga, o impasse continua. De um lado, armadores e terminais reportam que a transição aqui no Brasil tem sido tranquila, e a maior prova disso seria que nenhum container foi “deixado para trás”. Por outro lado, embarcadores e agentes de carga têm reportado atrasos na confirmação do recebimento do VGM, lentidão dos sistemas e, principalmente, aumento nos custos.
3. COTAÇÃO DO PETRÓLEO:
Após retomar o patamar de US$ 50/barril, a cotação internacional do petróleo vem apresentando certa volatilidade nas últimas semanas. Oficialmente, a justificativa dessa oscilação nas cotações seria a preocupação com o impacto econômico a ser gerado com a saída da Inglaterra da União Europeia, entretanto, existem outros fatores que parecem ilustrar melhor essas oscilações:
• Com o advento do gás de xisto, os EUA assumiram a liderança do ranking das reservas internacionais de petróleo, com com 264 bilhões de barris, enquanto a Rússia detém 256 bilhões, Arábia Saudita, 212 bilhões e a Venezuela). De acordo com a Rystad Energy, o polêmico e “recém descoberto” gás de xisto norte americano representa mais da metade das reservas daquele país, o que adicionou bastante capacidade ao mercado internacional;
• Retomada da produção no Canadá e na Nigéria (após cessar-fogo negociado com os rebeldes);
• Aumento de produção na Rússia e na Arábia Saudita;
• Pelo menos dois navios tanques carregados com gasolina estão ancorados há mais de uma semana em Nova York, além de que pelo menos outras três embarcações que foram desviadas de Nova York para outros portos da Flórida e do Golfo do México, numa clara demonstração de que os estoques num dos principais hubs de combustível norte americanos estão lotados.
A expectativa é de que, nas próximas semanas, a volatilidade continue. Porém a previsão se baseia exclusivamente na relação entre oferta e demanda, que vem apresentando viés de queda. Isso que poderia colocar pressão sobre o slowsteaming adotado pelos armadores nos últimos anos e, consequentemente, potencializar ainda mais o overcapacity de navios.
Acredito que esses três temas merecem continuar em nossos radares ao longo das próximas semanas, já que todos impactam de um modo ou outro todo o transporte marítimo mundial.
Leandro Barreto / Sócio-Consultor SOLVE Shipping
Administrador de empresas, especializado em economia internacional pela Universidade de Grenoble e em Inteligência Competitiva pela FEA/USP. Há mais de dez anos atuando no segmento, foi gerente de Inteligência de Mercado na Hamburg-Süd, professor pelo IBRAMERC e Diretor de Análises da Datamar Consulting. Atualmente, coordena projetos independentes de consultoria com forte atuação junto a armadores, autoridades portuárias, embarcadores e entidades públicas voltadas para o desenvolvimento do setor portuário.
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