...enquanto isso, a privatização das autoridades portuárias segue avançando!

Extraído da Revista digital Guia Marítimo - Setembro 2021

Nas últimas semanas vários eventos têm sinalizado que a desestatização das Autoridades Portuárias de Vitória, Santos e Itajaí tomam impulso e seguem um caminho sem volta. Durante apresentação na Santos Export realizada em Guarujá dias 23 e 24 de agosto, o Secretário Nacional de Portos, Diogo Piloni expôs alguns dos principais pontos que deverão reger o processo de desestatização da autoridade portuária de Santos. Enfatizando que o projeto não está inteiramente fechado, o Secretário colocou que se estima que o concessionário deverá investir ao longo dos 35 anos do contrato algo em torno de 16 bilhões de reais que deverão contemplar, dentre outros, o aprofundamento para de 17m, adequação do canal e a construção do túnel ligando Santos a Guarujá.

Assim como em Vitória, deverá haver um limitador para a participação dos atuais arrendatários ou armadores e ´permissionários num eventual consórcio em que não poderão deter mais de 15% de participação acionária individualmente ou 40% no total, havendo outros players participando, a fim de evitar conflitos de interesse. Outro ponto importante posto pelo Secretário é que deverá constar cláusula contratual em que havendo proposta para eventual alteração do PDZ ou da Poligonal do porto o concessionário deverá obrigatoriamente realizar consultas a todos os players do porto, incluindo permissionários operando fora da área do porto organizado e integrados na mesma área de influência.

O processo da CODESA segue mais adiantado, pois já foram realizadas as audiências públicas e foi publicada a resolução do CPPI nº 188 de 7/6/21** que aprovou “ad referendum” a modelagem da desestatização da CODESA e dos portos organizados de Vitória e Barra do Riacho. No momento está sendo encaminhado para apreciação do TCU, após o que estará liberado para ser publicado o edital, o que deve ocorrer até o final desse ano, e o leilão, no primeiro semestre de 2022. A forma da desestatização tanto da CODESA como da CODESP deverá ser a mesma, por alienação do controle acionário da companhia docas já existente, somada à concessão dos ativos. Ou seja, uma vez privatizada, a companhia firmará um contrato de concessão com o poder público, e terá um prazo limitado para explorar os ativos.

Um ponto importantíssimo trazido pelo Secretário Piloni foi o respeito aos contratos de arrendamento e outros vigentes. Segundo ele, haverá um processo de transição dos contratos regidos pelo direito público, para o regime do direito privado, já que o contratante passará a ser o novo gestor, porém serão colocados diversos dispositivos impedindo que esse gestor imponha alterações unilaterais e, em última análise, prevalecerão sempre as condições do contrato original, se assim for mais conveniente para o arrendatário.

Já no último dia 25 de agosto, num seminário promovido pela Comissão Parlamentar Mista, na Câmara Municipal de Itajaí o Secretário Piloni apresentou pela primeira vez o projeto elaborado para a desestatização de Itajaí. Considerando que o contrato de concessão da APM Terminals encerra-se em 31 de dezembro de 2022 e o Convênio de Delegação da gestão do Porto ao município de Itajaí encerra-se em janeiro de 2023, o Governo Federal tomou a decisão de licitar o porto como um todo para a iniciativa privada, incluindo o exercício da autoridade portuária e a operação dos quatro berços do porto, dedicando-o inteiramente à movimentação de contêineres.

Os principais pressupostos da licitação são:

a. Vigência por 35 anos, renováveis por igual período;

b. Investimento de 2,8 bilhões, dos quais 920 milhões nos 3 primeiros anos;

c. Capacidade para movimentação de até 1,2 milhão de TEUS/ANO

d. Estabelecimento de uma conta vinculada que receberá a maior parte dos recursos pagos pelo Concessionário ao Poder Concedente e que serão destinados para uso local, para aplicação em novos investimentos fora da área do porto organizado; recomposição da infraestrutura eventualmente danificada em razão de intempéries climáticas e recomposição do equilíbrio econômico-financeiro contratual.

Os investimentos nos três primeiros anos preveem a indenização de terrenos e ruas adjacentes ao porto, aumentando a área da concessão dos atuais 90 mil m2 para 394 mil m2, aquisição de 8 novos porteineres e 30 RTG´s, construção da segunda fase da bacia de evolução, com construção e readequação do molhe norte e dragagem para permitir calado de 14,5m e entrada de navios de 366m LOA e, posteriormente, de 400m LOA.

Segundo o cronograma da Secretaria de Portos o processo prevê uma audiência pública, a ser realizada pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) em outubro de 2021; a deliberação do Tribunal de Contas da União, em abril de 2022; e, finalmente, a realização do leilão, em junho de 2022.

Há, portanto, uma diferença substancial no processo de concessão de Vitória e Santos, onde na verdade haverá a alienação das ações das respectivas companhias docas, e ato subsequente a concessão da gestão. Já no porto de Itajaí, onde não existe uma companhia docas, uma vez que o porto foi delegado ao município pelo Governo Federal, o concessionário acumulará as funções de operador e de autoridade portuária.

O processo, embora tenha tomado impulso, ainda tem muitos pontos em aberto para discussão:

  • Quais serão as reais garantias contra conflitos de interesse, num porto como Itajaí, por exemplo onde frente a frente devem conviver um terminal de containers dentro do porto organizado, investido de poderes de autoridade portuária e outro, privado, fora da área do porto organizado, dividindo a mesma infraestrutura de acesso aquaviário?
  • Qual a liberdade que os concessionários terão em fixar e cobrar tarifas?
  • Como será a relação desse concessionário com o poder público local, a sociedade e o importante papel no desenvolvimento socioeconômico desempenhado por esses portos?


Os debates estão abertos e muita discussão ainda deverá ocorrer, o que é muito saudável, considerando que se tratam de concessões de longo prazo, em que não é possível errar a mão.

**CPPI – Conselho do Programa de Parcerias de Investimento

Escrito por:

Robert Grantham

Formado pela PUC/RS com licenciatura em ensino da língua inglesa, Robert Grantham desenvolveu sua carreira na área da navegação, atuando como executivo em agencias marítimas, como Wilson Sons, Orion e Lachmann, com passagem pelo Banco de Desenvolvimento do Estado do Rio Grande do Sul (Badesul), atuando na área internacional. Posteriormente foi o responsável pelo start-up das operações da China Shipping no Brasil e Diretor Comercial e Executivo do Porto de Itajaí. Atualmente dedica-se a consultoria, como sócio da empresa Solve Shipping Specialists, tendo realizado trabalhos para Drewry, TESC, LogZ, Porto de Itajaí, Steamship Mutual - P&I, Norsul entre outros. Como palestrante e moderador participou de eventos como Mare Forum, Port Finance International Brazil, Container Handling Technology Brazil, Itajaí Trade Summit. É colaborador da revista Container Management e Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem do Brasil (CAMEDIARB) e da Câmara de Arbitragem e Mediação de Santa Catarina (CAMESC).



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